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Pabllo Vittar - Batidão Tropical Vol. 2 (2024)

 


Informações quentes: 
9 de Abril de 2024
14 músicas, 34 minutos
Forró, Brega, Tecnobrega, Melody, Piseiro a peste e o caraio tudo 
Sony Brasil

Se recuperando de uma tal Noitada que virou flop busca inspiração na sua raízes (de certa forma uma zona de conforto) Pabllo Vittar continua o projeto Batidão Tropical três anos depois do primeiro título e na boa, estamos em abril e já é o melhor álbum do ano. 

Pouco antes de falar do álbum eu preciso dizer que sou fã, muita fã, da Pabllo por um valor que prezo muito nos artistas que escuto: conseguir trabalhar em qualquer ritmo/gênero. Assim como o Prince, que é bastante próximo ao funk no começo da carreira e depois consegue cantar qualquer coisa, Pabllo Vittar tem essa qualidade parecida, ela se sai muito bem em qualquer coisa que se proponha a fazer, não é um indicativo de ser "melhor ou pior" (vamos parar de pensar tudo em ranking) apenas uma característica que me agrada bastante, então tenho mais facilidade em digerir tal projeto. Mesmo em zona 'habitual' entrega e ousa a apresentar determinada coisas, mas vamos com calma. 

Antes de mais nada, em nossa ritualística padrão, havemos de falar da capa primeiro. Com menos cores do que o primeiro título, mas mantendo o mesmo calor tropical presente, tonalidades quentes, uma paleta de cores bem discreta comparada a discografia da drag fontes bem blocadas e tímidas em vermelho com um "tropical" cursivo com um degradê entre o amarelo e o vermelho, bem ""anos 80"" o que nos indica um apelo a nostalgia, fato que pode ser observado com o "selo" de volume 2 no finalzinho do nome do álbum. 
Essa fonte cursiva misturada com texto blocado bem centralizado em cima do CD é um clássico das bandas de forró do período, isso denuncia a intenção de nossa querida Pabllo ao apresentar essa capa. A inspiração é mais "forrólesca" do que brega nesse caso.

Como em algumas que mostrarei embaixo: 

Clássico.

Pabllo bebe bastante dessa banda, falo depois

A capa da Magníficos também tá presente o degradêzinho, existe outros milhares de discos com mistura de fontes e cara, peak of design, termos que admitir. 

Resumidamente, a capa apresenta o mesmo calor do primeiro batidão tropical, mas dá alguns indicativos bem claros e consegue "atualizar" a estética do forró do finalzinho dos anos 90 comecinho dos anos 2000 sem parodiar nenhuma banda e ao mesmo tempo sem fazer algo genérico e sem personalidade, tem personalidade e tem apelo a saudade ao mesmo tempo.

Saindo inclusive em uma espécime de "revival" de algumas músicas consideradas retrô, fenômeno conhecido como báu pelas bandas antigas e contando com regravações ou até ressucitação de estilos praticamente mortos, como as músicas de vaquejadas (tipo Kara Véia) que voltaram a ganhar popularidade com Tarcísio do Acordeon, João Gomes e outros cantores que bebem dessa fonte. 

Esse último parágrafo resume tudo que eu tinha pra falar desse álbum, então é uma bela de uma capa que transfere precisamente o que o album precisa. Então assim que arrochamos o dedo no play vem...

Uma bela guitarrada de Pra Te Esquecer uma música do Calypso Algumas coisas presentes nessa música vão se estender ao resto do projeto, termos a clássica batida desse brega-pop (tipo Calypso**) com uma bateria bastante presentes, instrumentos de sopro, aquele guitarra mastigadinha com harmonias curtas e estrofes pequenas, o riff dos instrumentos de sopro são bem chicletinhos e precisamente todos os elementos da música da época.
** Eu NÃO SABIA que essa música era da Banda Calypso, descobri revisando o texto, então mesmo sem saber que era uma música regravada, ela me passou a impressão da música do período. Puxa vida... 

Não entendo NADA de brega paraense, mas aos meus ouvidos seria algo entre o "pico" do gênero, que é no período metade dos anos 2000 até o estourar dos anos 2010 (ou seja uns 2005-2012), só que com um porém, um polimento melhor na sonoridade até porque Pabllo tem muito mais recursos de produção hoje em 2024 do que essas bandas da época. Também um elemento bastante interessante na forma de cantar, não tenho outras palavras a não ser mencionar que ela "canta gemendo" (por mais hilário que pareça, não tem termo técnico para isso) o que também é beeeeem comum para as bandas do período, ao que me parece, um pouco abaixo do seu tom habitual que se aproxima melhor da voz da Joelma. 

Depois vem Idiota (música inédita talvez?) um tipo de forró atual (estilo Mari Fernandez, Fabinho Testado), um piseirinho bem básico sobre sentar em ex, nada diferente do gênero. Te falar, não que o arranjo do Mataderos tenha ficado ruim, mas se fosse uma seresta ou na pegada mais arrocha mesmo, acredito que ia dar um caldo muito mais palatável (pra mim) do que essa pegada de piseiro. Vou esperar sair a versão do Unha Pintada (cantor de arrocha daqui de Sergipe) para dar uma opinião melhor. 

Agora, Pede Pra Eu Ficar que é uma versão "traduzida"(na verdade brasileira mesmo) de uma música da Roxette (essa aqui) a senhora Pabllo Vittar entregou TUDO, foi o primeiro single lançado lá pra dois meses atrás e eu fiquei sem acreditar. A primeira coisa que veio a minha mente foi "caralho ela imitou aquela bandas de forró antigo" daí ela lança um álbum com estética de forró(e brega) antigo, isso é tudo que preciso dizer.

Ao traduzir uma música de tiozinho dos anos 80 Pabllo desmontra suas credenciais e entende perfeitamente o tipo de público que quer antigir com o projeto, é uma demonstração perfeita da estética que está visando sem precisar parodiar ou fazer uma caricatura de uma banda determinada, com o aportuguesamento fica evidente que é uma pessoa que ENTENDE claramente do assunto e tem propriedade para brincar com o gênero. 

Essa música poderia ter sido lançada, sem mudar uma vírgula da letra, pela banda Noda de Caju, Baby Som, Forrozão Tropykalia ou até Calcinha Preta ou seja, é a perfeita continuação do trabalho artístico feito no perído, uma continuação, um prosseguimento do legado de um gênero tão popular em nosso nordeste, é um passo a frente, sem pretensão alguma. 

Esse é erro muito comum de representação da cultura nordestina mídias a fora, inclusive em algumas feitos por alguns nordestinos (não vou querer mencionar aquele álbum tosco da Juliette). Na verdade uma série de erros, o primeiro é a caricatura, puxar só cacto, sertão, seca e chapéu de couro, não que esses elementos não façam parte da cultura nordestina, mas eles são mais efetivos para compor um personagem do Zorra Total do que um reconhecimento do nordestino nessas figuras. O outro elemento que se peca bastante é a paródia, a quase imitação de algo que já fez sucesso por aqui e daí fica algo meio tosco, forçado e pouco convincente, que na minha opinião entra o filme Bacurau (2019) um tipo de paródia de cidade pequena, que não me pegou legal. Continua sendo um filme decente. Alias tem bilhões de cidades fictícias na mídia tipo Bacurau. 

Longe de mim julgar produções que tentem reproduzir determinado período histórico (nesse caso o forró dos anos 2000) ou culturas como um todo, aliás uma tão complexa e rica como a nordestina até porque são NOVE estados, é um trabalho díficil, onde muitos se trupicam, mas quem consegue exercer com precisão sempre se destaca e ganha reconhecimento, do mesmo vale para a série Cangaço Novo, que tem uma resenha aqui nesse blog. 

Já que mencionei a obra, ela tem as mesmas valorações que Pede Pra Eu Ficar, faz o simples que dá certo, e as vezes a simplificidade consegue abarcar todo contexto cultural necessário e toda carga precisa para entender alguns temas, é o caso da música aqui, uma simples versão brasileira que só quem nasceu no nordeste ou viveu aqui no período sabe reconhecer a beleza e os objetivos da música. Acerta em cheio e puta que pariu QUE SAUDADES de músicas gringas traduzidas, melhores do que as originais, diga-se de passagem. 

Todo o exposto sobre o nordeste que apresentei aqui, se faz presente no brega que a Pabllo Vittar trouxe no álbum, mas estes tenho pouquíssimo repertório para falar, pois não entendo nada da cena mesmo assim a apresentação é agradável e conssoante com o resto do álbum não havendo uma divisão clara entre "momento brega" e "momento forró", ambos sempre se relacionaram bastante, havendo pontos de intercessão entre eles, esse álbum é um deles. 

Rubi que é originalmente da Banda Djavú. E cara, alguém desavisado pode achar que a música é original tá? Muito bem encaixada e muito bem regravada em comparação a original, não deve em nada o arranjo tecnobrega feito. Aliás só pesquisando hoje eu descobri que a Djavú é uma banda baiana, fica a informação.

Também na sequência termos São Amores que é originalmente do Forró Miúdo e que arranjo gostinho, a voz da Pabllo em seu belo tom habitual se encaixa muito bem no tema, uma boa escolha pro repertório. 

Achando pouco, a bonita decide regravar uns dos MAIORES HINOS da nossa música nacional, Me Usa, apenas. Cara, essa música me extraiu emoções que... Nossa, é algo inesperado; fantástico, pra não falar dizer magnífico e fazer trocadilho com a música. Bem, a versão da Pabllo não deve em nada em relação com a música original e é tão boa quanto, dá pra notar naturalidade de quem cresceu ouvindo esse tipo de música e hoje tem oportunidade de regravar. 

Vem uma regravação de uma música da Gaby Amarantos (uma música do Roxette de novo) junto com a própria Gaby, ok.

Só tenho a dizer que Pabllo Vittar gravou junto com Taty Girl, pra quem não conhece é uma verdadeira lenda viva do Forró eletronico/romantico chame como quiser, uns dos maiores nomes e cantou inúmeros sucessos, seja em carreira solo seja no Solteirões do Forró ou Forró Real, sou fã pra caralho, não esperava ouvir as duas juntas. Sem palavras totalmente me pegou com as calças arriadas. 

Nos finalmentes termos, nas Ondas do Rádio da Banda Companhia do Calypso que é a única música com o ritmo levemente diferente da original, mais 'piseirada'. Depois com Ai Ai Ai Mega Princípe da Banda Batidão que tem uma pegada muito diferente, se destoa bastante do resto da estilística do álbum.  Realmente é uma pegada muito diferente e pra fechar o caixão, Não Desligue o Telefone da Banda Djavu que tem uma pegada um pouco mais techno do que brega, mas é um mero detalhe, não me agradou bastante. 

Caixão e vela preta, está acabado Batidão Tropical Volume 2 

Resumidamente o álbum é uma coletânia de raízes da maranhense Pabllo Vittar com uma excelente música original no meio, ou mais de uma, não se Idiota é original ou não. Arranjos bastantes respeitosos sem um clima de homenagem que o EP recente pro Luiz Melodia tem. Estando mais na real regravação do que uma efeitiva homenagem. 

Tem um clima de na real apreciação, de celebração da cultura popular, que geralmente é escanteiada por ser "música meme" e tem pouca valoração artística no público geral. Eu digo com isso porque bandas como a Banda Djavu viralizam por serem 'engraçadas' ou enfadonhas, mas não no sentido leve da coisa e sim como algo que fosse de baixa qualidade, entendem? As vezes destacam só o amadorismo os poucos recursos e com isso acabam, mesmo viralizando a obra, a diminuindo de sua importancia na cultura brasileira.  
Ou seja, o povo acaba tendo uma vergonha de si mesmo ou vezes nem leva a sério, ainda assim há muitos que sentem saudades desse tempo e nessa saudades, não uma nostalgia barata, que se apoia todo o projeto. 
A nostalgia pode levar a um sentimento reacionário bastante comum de achar que tudo antigamente era melhor, mas na verdade você não sente falta da Banda Djavú, você sente falta das condições econômicas da época, idade mais jovens, das festas e uma vida com menos responsabilidades.

Saudoso, respeitoso e música popular levado a sério, é um belo extrato da marginal mercadológica brasileira, comendo igual a mingau quente, pelas beiradas. É um passo da frente ao invés de um olhar pra trás, um sopro de alívio e certeza que a nossa cultura continua viva. A cultura do forró é um gigante gesto de indepência cultural dos grandes artista e mídia do "eixo" (RJ/SP) que PRECISA ser tão levada a sério quanto. 

Mesmo com uma carga cultura fortíssima, o álbum funciona até para quem não entende de cara as referencias, por exemplo eu não conhecia nenhuma das músicas bregas regravadas, mas ainda sim ele funciona por completo, por casar muito bem os elementos de (tecno)brega e forró, é um ode a cultura e um ode ao amor. 

Por mais que pareça estar mais próxima e uma aparente zona de conforto, ousa na escolha de algumas músicas, percorrendo caminhos menos óbvios, o que garante PERSONALIDADE ao projeto ao invés de recorrer a escolhas preguiçosas. 

Esse álbum é um belíssimo convite ao norte do país para quem desconhece e um excelente passo adiante da nossa riquíssima cultura. Uma veradeira maniçoba, com gosto forte, convicta em si mesma e sem a menor preocupação de desagradar quem ache a aparência feia.  

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