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Guerra é uma idiotice, Vinland Saga 1º Temporada

 

Thorkell não tem inimigos, pelo menos nenhum vivo


Bem, podemos dizer que Vinland Saga está em alta, chegando em todo tipo de público, ainda mais com a popularização dos memes, eu fui uns desses cooptados, mesmo torcendo o nariz em relação a animes*, me interessei nesse em específico. 

* pequena alínea, eu acho o gênero de animes pouco atrativo , em qualquer aspecto,  e mangás sou MUITO ignorante mesmo, não tenho vergonha de falar sobre. Então cheguei em Vinland totalmente puro, sem nunca ter sido contato com animes, muito pelo contrário, detestando alguns. Eu nunca vi nem Dragon Ball, então talvez cometa algum erro de analise por não estar habituado com o gênero.

Essa postagem não é uma resenha completa de Vinland Saga, tem análise a rodo sobre o anime/mangá na internet, não tenho muita capacidade de colocar mais uma completa

Esse anime me pegou de um jeito, de um jeito que fiquei bastante interessado em ler o mangá, segundo os sites devidamente especializados em animês, Vinland Saga, da Netflix, cobre o primeiro arco, capítulo 1 até o 54, o início da história de Thorfin junto com a milícia de Askeladd, que é o verdadeiro protagonista do arco, pelo menos na minha interpretação, Askeladd que faz a história andar, apesar de não ser sobre ele.

Vinland Saga é externamente pretensioso, eu diria até presunçoso em alguns momentos. O que seria uma obra pretenciosa? A pretensão, a proposição do que se dispõe a fazer, Vinland Saga se dispõe já nos três primeiros capítulos a ser toda uma jornada com pontos que são uma filosofia no sentido mais purista do termo, não figurativo, é um anime filosófico e isso não é a segunda camada de interpretação.

A obra é presunçosa quando debate sobre "o que é o amor", o anime/mangá está lotado dessas ontologias, dentro delas, o que é ser um guerreiro, e a estupidez da guerra.

Os animês adoram uma porradaria, alguns com poderzinho outros com lutinha (ou os dois mesmo), quando se falamos desse gênero "shonen", que é o mais popular aqui no ocidente. Um protagonista masculino jovem em busca de ser algo grandioso, tipo um mestre hokage, aparentam ser animes leves sempre quase sempre no mundo masculinista da coisa, com direito aliás de personagem femininas que quebram qualquer convenção sobre igualdade gênero, um suco de misoginia em alguns casos, enfim, não que as produções ocidentais fossem diferentes. Olhando Vinland Saga de fora, parece só uma dessas obras "shonen", um anime genérico, só que ambientado no universo nórdico, esse julgar o livro pela capa me afastou por muito tempo, ainda mais saindo pela Netflix, aos meus olhos, de alguém de fora do gênero, não me atraía em nada. Caí no papo do Brizola de "Se algo tem rabo de jacaré, couro de jacaré, boca de jacaré, pé de jacaré, olho de jacaré, corpo de jacaré e cabeça de jacaré, como é que não é jacaré." tanto por ser um shonenzinho, tanto por ser um anime da Netflix.

A violência em Vinland Saga é um tédio. 

As cenas de guerra são tediosas* e esse recurso narrativo é interessante para demonstrar o ponto, as cenas de combate não tem um apelo heroico, com grande trilhas sonoras, câmera lenta, close de coxas malhadas e todo desejo aflorado de um mundo másculo, APESAR DO GORE elas são protocolares, acontecem as vezes até como uma plano de fundo, bem tanto faz, é só mais uma ação para história continuar. Vinland Saga faz que as cenas de ação pareçam uma mera ponte para uma cena de dialogo acontecer, o perfeito contrário da tônica da maioria das produções com enforque na guerra. Uma antítese do anime seria o filme 300, do Snyder... Que é um filme justamente sobre um conto heroico espartano.

tanquinhos definidos e muitas lanças pro alto

Você já deve ter assistido 300, o epítome da performance masculina guerreando bravamente contra uma figura relativamente "afeminada" (com muita aspas) que é o Xerxes. Porque a guerra é essa beleza, beleza no sentido de contemplação, ao ver o quão belo são os atores em seus corpos esculturais, ao ponto de lutarem de sunguinha e capa vermelha, enquanto que em Vinland Saga (sem sunguinha devido ao frio) guerrear é quase uma comédia, é algo que ao decorrer do anime vira alívio cômico, materializado no personagem do Thorkell, o alto. Thorkell é um típico personagem apaixonado pela guerra e pela honra, servindo de contraponto para a vibe do anime. Comédia no sentido mais clássico, algo utilizado para a subversão de valores através do riso, ou da comicidade, neste caso em especial através de uma certa "galhofa", com certeza ver o tanto de gente sendo aberta no meio, não é feito para levar a sério. Sabe as cenas de ação em bollywood? É esse tipo de comicidade que me refiro. 

Ainda falando em 300,  é meio sobre como você é forte por andar com os mais fortes e os melhores, os mais honrados, os de valores, ou seja, se você quiser ser forte, precisa se aliar com quem também é forte, destemido, alto nível, e um (vou utilizar palavra de coachs porque eles adoram esse filme) mindset vencedor, águia anda com águia. Eu citei vários termos de internet porque é bastante popular nas redes e filmes como 300 fazem um mal danado pra cabeça de uma galera, só ver a quantidade de sites, empresas que tem esse apelo greco-romano, o filme é bem responsável por popularizar os espartanos. 

 A união dos mais fortes, batalhando para proteger aquilo que é seu... Humm... tipo uns gravetinhos juntos, que unidos não podem ser quebrados... 

 

facho de entender agora? 

Por mais que o fascismo tenha um apelo ao um dito "coletivismo" em nada pensa no verdadeiro coletivo, é apenas um 'império de mim' ou seja, eu apoio tal líder/organização porque EU julgo ser o melhor, o mais valoroso e etc, através de valores que EU considero importantes, para o mantimento da MINHA existência - que não está sendo ameaçada, é importante salientar que uns dos principais fatores do fascismo é o revanchismo, mais ou menos uma lógica que a sociedade te deve algo, retirou algo de você ou existe um bem a ser protegido (como a masculinidade, e os tempos de uma sociedade raíz). A frase mais fascista que rondeia a internet é aquela "homens fortes criam tempos mais fáceis bla bla bla". Ah, conta outra. 

Isso não está só presente em 300, a grande maioria das produções de guerra é mais ou menos nessa toada, a união dos mais forte para superar alguma coisa. Ou no caso do First Blood, Rambo no Brasil, que no primeiro filme ainda fala um pouco dos traumas dos veteranos, e já no segundo filme e no terceiro tem o Stallone, sem camisa, dizimando malditos comunistas! Sejam vietcongs, sejam soviéticos. Ou seja, quando os filmes de guerra não estão falando um ode a masculinidade, a violência e o fascismo, estão fazendo pura propaganda estadunidense, ou os dois ao mesmo tempo. É um gênero muito contaminado, apesar de gostar do gênero de filmes de guerra do Vietnã. 
Vai, alguns são bons.

"AAHHG O QUE É UM KILOMETROO???!!!"

Dado todo esse contexto do que produções de guerra. O que acontece em Vinland Saga? Como já mencionei toda essa 'macheza' que a guerra nos proporciona fica a encargo da comédia, sendo o Thorkell responsável pelo alívio cômico da obra. Ao invés de buscar força nos melhores, um verdadeiro guerreiro deve olhar para dentro e não se deixar seduzir por uma cultura tão porca de controle por meio da violência, afinal, ninguém tem inimigos, não há ninguém no mundo que mereça ser machucado. O campo de batalha te leva aos piores sentimentos, porque você age completamente sem consciência dos próprios atos, embrigado por sensações fúteis como o prazer, a honra, a ganância e no caso do Thorfin, a vingança. A vingança leva o Thorfin a perder praticamente 10 anos de sua vida, ele não tinha outra coisa em mente se não a duelar, em nome de sua honra, com Askeladd, alguém claramente muito superior em qualquer aspecto. Eu diria até que Askeladd acabou virando uma figura paterna na vida do Thorfin, justificável, o cara é foda mesmo.

A postagem não é sobre isso, seguindo.

Talvez a guerra lhe traga uma eterna frustação, especialmente no contexto da cultura nórdica onde há uma clara contradição, quanto mais batalhas você ganha, mais longe está de chegar no paraíso. Morrer em batalha não é algo "ruim", mesmo que quanto mais batalhas se vença, melhor guerreiro você é, ao mesmo tempo que a cada batalha vencida, foi uma oportunidade perdida de morrer e entrar no Valhalla. Então o guerreiro bem sucedido é alguém frustrado que talvez seja rezando para perder uma batalha ou pelo menos se divertir no que está fazendo, que é exatamente a ideia do Thorkell.

Em um mundo tão sanguinário, aquele que consegue respeito sem sujar a sua espada de sangue é o mais forte dos guerreiros, estou falando de Thors, pai de Thorfin, uma figura messiânica que paira sobre toda primeira temporada. Vou voltar para os quadros comparativos 

Thors vs John Rambo

First Blood, o primeiro filme do Rambo, quando os produtores respeitaram minimamente o livro que serve de adaptação, assim como em outros filmes de guerra, fala dos traumas causados pela guerra do Vietnã, como a guerra traumatiza seus "nobres" combatentes. Rambo é um ex-boina verde que sofre estresse pós traumático depois da polícia ser os porcos que são e o torturar na cadeia, um homem traumatizado pela guerra, uma guerra sem sentido diga-se de passagem. Já Thors, o troll de Jom, pelas informações que termos na primeira temporada, é um excelentíssimo guerreiro, o maior de todos dos jomsvikings que tem uma espécie de realização filosófica de quais valores precisam ser cobrados de um verdadeiro guerreiro, ou seja, de quão mal ele pode fazer aos outros, não de como os outros o traumatizaram, mas sim de todo sofrimento que as suas ações causam nas pessoas, em um geral. No lugar de só discutir os efeitos da guerra, Vinland Saga dá um passo a atrás e questiona a sua ontologia, por que a guerra? O que é a guerra? O que é ser um guerreiro? A conclusão que termos é que a guerra é uma estupidez, nela não havendo nenhuma glória. Tanto narrativamente em tela, tanto em sua mensagem a guerra não é um processo de sofrimento que os grandes homens passam, mas sim uma burrice, um derreamento de sangue que nunca leva a lugar nenhum.    

Se a guerra é mostrada de uma forma menos ruim da, a política por consequência também é. A política em Vinland Saga é uns dos pontos altos e mais ou menos a primeira temporada é sobre isso, os arranjos da invasão a Inglaterra pelos Danos. Isso se dá porque a "guerra é a continuação da política por outros meios", a guerra acontece para a remoção de obstáculos, servindo para concretizar os objetivos políticos dela. Pode portanto dizer-se que a política é guerra sem derramamento de sangue, e a guerra, política sangrenta. Guerra é um, e não devem ser glorificadas, sejam as justas ou injustas, a guerra é um mero instrumento da política, sendo necessária até quando lutamos politicamente pela paz e libertação dos povos, por consequentemente pela abolição de todas as guerras. É muito perigoso alguém elogiar um confronto ignorando o xadrez envolvido ali, devemos sempre está atentos a isso.

Já-me-falaram que algumas pessoas reclamam da falta de combate na segunda temporada, isso foi o suficiente para me motivar a continuar assistindo. Pelo o que parece, com o amadurecimento de Thorfin, o anime vai de shonen para seinen. O que diabos é um seinen? Preciso continuar a obra pra saber, depois saberemos. 

Quem sabe não pinta outra postagem aqui? Fiquem ligades no marginália 3! 

*Há exceções, que confirmam a regra (ep. 7). Ainda é uma anime, ainda é um shonen, então algumas cenas "mais comuns" precisam acontecer para cooptar o público médio. Audiência ainda é um quesito importante, porque se ninguém assiste, é cancelada e vai de vala. (uma triste ironia citar vala numa postagem sobre Vinland Saga, quem viu sabe o que estou falando)

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