"que porra tá acontecendo" |
***Resenha com spoilers*****
Antes de mais nada, vou ressaltar uma coisa, pelos caminhos que esse mangá tomou eu não vou conseguir fazer aquela análise capitulo a capitulo que estava fazendo. Acredito que esse texto seja mais curto (não vai).
Em português claro, o volume 3 de Black Kamen Rider é mais conceitual/contemplativo, visualmente logo nas primeiras histórias termos planos belíssimos com imagens poucos conclusivas, algo que remete a um delírio ou alucinação. Separei alguns quadros que expressam forte esse sentimento.
Já abre daquele jeito, olha que bonitão:
Meu favorito
Também MUITAS explosões e raios, bastante tokusatsu
Uma questão gráfica interessante, mesmo utilizando de elementos "bregas" nas histórias de ação no geral (muitos efeitos, explosões, piruetas, raios, lasers e etc) o Shotaro Ishinomori consegue levar algo galhofa a um filme do Denis Villeneuve (diretor de Duna, A Chegada e Blader Runner 2049), eu não estou dizendo que os filmes do Villeneuve são "superiores"*, apenas contemplativos, filmes cabeças em linguagem popular, mesmo sendo hollywoodiano. Enquanto o gênero de filmes/séries tokusatsu são mais baratinhos e tem uma fanbase que curte a breguice mesmo, eu bem incluso.
Veja uma explosão aleatória em Jaspion comparada com um painel de Kamen Rider Black, possuem os mesmos elementos conceituais, mas uma estética totalmente diferente. Algo que é até meio enfadonho, vira escabroso no traço do Ishinomori.
*Deixando claro, Duna não é melhor do que Jaspion, apenas possuem estilos diferentes, épocas diferentes, públicos diferentes e não sentam na mesma mesa, sequer são dignos de comparação. Eu trouxe o Villeneuve para a conversa porque a comunidade nerd/cinéfila só consegue reconhecer beleza/conceito quando o filme é chato, ou mega pretencioso, hollywoodiano enquanto enfia rasgando na goela uma porrada de rótulos em outras produções (geralmente não-americanas). Se o filme não for de determinado diretor ou estúdio aí ele nem merece ser analisado, é filme 'comercial bem qualquer-coisa', se o filme não aparece em listas ou tem recebem notas altas nos sites de cinema, tá completamente fora do radar da contemplação, é como se contemplar/pensar/saltar os olhos não pudesse andar junto com a diversão. Você não precisa se "emburrecer" para se divertir com algo. Toda obra, por mais só enterterimento que seja, terá algo a ser pensado sobre. Mesmo que forma metalinguistica.Ou seja, vamos receber aquilo que a obra tem a nos dizer, ao invés de analisar apenas o rótulo que aparece na descrição na amazon, Kamen Rider Black é um tokusatsu sim! Com receitinha de tokusatsu sim! E consegue entregar um conteúdo bastante recheado, no caso do capítulo 3 uma HQ quase abstrata. Do mesmo vale do contrário, você pode se divertir com coisas chatas. (as vezes)
Pooooois bem, por falar de em receitinha de bolo, o começo das primeiras histórias é bem parecido com as anteriores, seguindo aquele padrão de #1 situação estável #2 suge um rumor ou lenda de algum bicho bem bizarro #3 o bicho aparece fazendo uma gracinha e é ESTRAÇALHADO pelo nosso Kamen Rider Black. Vai nessa até a quinta história, mais ou menos.
Tudo segue nessa pegada, destacando o primeiro que não tem pau mandado da gorgom, apenas um proto-romance-semi-incestuoso entre Kotaro e sua irmã mais nova, como eles são irmãos de criação apenas, nem rola tanto problema assim, a maior questão que cerca é como Kotaro pode se relacionar com quem se seu lado selvagem está cada dia mais aflorado? Díficil achar um amor em nossas vidas quando você é um ciborgue neonazista, digo, apenas horrores além da vã compreensão humana.
Também cabe destacar que o começo não é lento, porque vai adcionando aos poucos elementos de suspense, os pesadelos do Kotaro, que começam com imagens que não dizem muita coisa, como ser perseguido pelo Flamengo.
Daqui rola uma inteligência do Shotaro Ishinomori, que ao revelar o maior suspense da saga, o paradeiro do Nobuhiko, ele dá início a um novo que, se estivesse presente na história desde do começo, ficaria cansativo. Assim como o mistério confuso de onde estava o irmão de Kotaro já estava começando a ficar. E que mistério é esse? Kotaro tem visões em forma de pesadelo com um grupo aborigene (australianos) que vieram 30 anos do futuro para avisar um seguinte: o Rei Demônio está governando o planeta, e você será o nosso salvador.
Sim, tem rolê de viagem do tempo, mas falerei disso mais tarde.
Nobuhiko FINALMENTE aparece, mas está longe de ser um alívio. Durante toda história não sabemos se o Nobuhiko conseguiu escapar ou é um enviado da Gorgom para convencer o Kotaro a voltar a organização, pra piorar, nas visões/pesadelos que ocorrem a todo momento com o Kotaro aparece um "rei demônio" ou seja, a Gorgom ganhou! Sim, na história a organização malvadona consegue chegar a seu objetivo, será que foi Nobuhiko que concluiu o plano? Ele sabe que é um Ciborgue? Ele se transforma em grilo também? Sim, se transforma. Mas as outras perguntas não serão respondidas.
E finalmente termos agora dois Kamen Riders, tradição ao longo das séries em todos o Kamen Rider há pelo menos dois, e a história dessa tradição é no mínimo curiosa.
O mangá original, lá dos anos 70 foi publicado junto a série de TV, assim como o Kamen Rider Black também, acontece que o dublê/interprete do Kamen Rider sofreu um acidente quase fatal de moto, fazendo que o protagonista numero um (Takeshi Hongo) não pudesse mais ir ao ar, ele durou o episódio piloto até o 13, então surgiu um novo personagen Hayato Ichimonji, com um novo ator e uma nova história que durou até a história 53, quando o ator de Takeshi Hongo estava hábil para voltar as telinhas, assim o Kamen Rider 2 some e volta lá no finalzinho da série pra lutar ao lado contra a Shocker (nome da organização vilã no Kamen Rider original). Portanto desde então, toda história do Kamen Rider há pelo menos dois deles.
Hayato e Hongo |
A relação entre os dois fica meio merda, Kotaro desconfia bastante do irmão, por outro lado Nobuhiko não aparece tanto para mostrar suas intenções, permanecendo aquele novelão onde a gente fica tentando, rezando, DESESPERADO para o protagonista conheça quem verdadeiramente é a grande vilã. É sério, tem até aquelas encaradas bem novelas da globo pra camera...
ele não é de confiança |
Os caminhos que a história levam foram uma grande surpresa pra mim, esperava mais ver de Nobuhiko vs Kotaro, que é uma luta que a todo momento parece que vai estourar, mas não acontece. Motivos? Kotaro tá procurando a base Gorgom a todo custo, e a história viaja MUITO em seus conceitos.
Vamos lá, eu tinha elogiado na resenha passada a apresentação de elementos sobrenaturais para a trama, até porque essa coisa meio "ah é tudo cientista da gorgom" não cola sempre, as produções de heróis parecem ter vergonhas as vezes de falar na palavra mágia, é um receio até justificado, já que a fantasia é muito associado a produções infantis e ninguém quer ser criança ou associado a coisa de criança, então sempre tem aquele vernizinho de adultice, para atrair públicos mais sérios. Mas na boa, se a história fala que os Gorgom são bruxos e o Kotaro passou por um feitiço, eu super comparia tranquilo.
Não deixa de ser uma maldição.
O aspecto sobrenatural volta aparecer aqui, tanto na questão dessas visões aborigenes que assombram o Kotaro tanto na luta contra a DEUSA SHIVA, que tem TUDO A VER com a história que é a deusa da reconstrução e destruição (vice-versa), que é exatamente o plano da organização malígna Gorgom, extirpar a raça humana da terra para a ascensão de uma raça superior. Ela aparece fazendo umas graças, até fora do humor do mangá no geral e pra mim é a melhor personagem.
Também garantiu a minha página favorita em todos capítulos pra mim, olha que bonito, é logo depois que Shiva aparece:
belíssimo |
Antes de eu comentar o grande final, gostaria de comentar sobre a Gorgom, essa organização não aparece durante toda história. Os capítulos finais focam na caçada por sua base/quartel general, porém não se acha, o máximo que termos são algumas instalações randomicas espalhadas pelo mundo, mas o rosto do grande vilão da história não aparece, só é mencionado. Na série tem um tipo de conselho Gorgom todo engraçadinho, esperava ver suas versões no mangá, mas em nenhum momento aparece.
Isso só dá caldo nessa sopa de desespero que o Kotaro está passando, porque é um moleque de pouco mais 18 anos completos, lutando contra uma coisa que não faz a menor ideia de sua dimensão. Que porra é a Gorgom? Não sabemos. A suspeita é que ela está instalada no Nepal, que é justamente essa luta contra Shiva, mas não dá.
É impossível derrotar um inimigo que você não enxerga, o resultado não poderia ser diferente, a Gorgom venceu. Depois da luta contra Shiva, a linha do tempo vira uma bagunça, Kotaro fica oscilando entre passado e futuro e futurão, o futuro mais longe é onde ele se encontra com o grupo aborigena 30 anos na frente, onde é descrito que ocorreu uma guerra nuclear e quase toda vida humana da terra é estirpada. Onde vive apenas um reinado do Rei Demonio, o grande imperador Gorgom.
Se tu ligou os pontos deve estar pensando que ele é ninguém menos que Nobuhiko, o irmão maléfico do Kotaro hein? Mas não! É O PRÓPRIO KOTARO, fazendo um puta plot twist na história! Então já é ventilado no começo que perdemos, a luta do presente do Kotaro é sem fundamento, a Gorgom irá vencer e ele será o pivô de tudo isso. E a grande luta com seu irmão? Talvez ela tenha acontecendo talvez não, para o último terço, a história oscila entre episódios separados e apesar de acabar o mangá, não nos oferece nenhuma conclusão do que de fato aconteceu.
E mais uma vez esse elemento do "salvador" ser na verdade o vilão, no caso isso é um tema muito presente na história, aquele que se é esperado ser o salvador, na verdade está para destruir o lugar. Como no exemplo específico, Kotaro tinha sido anunciado pelos videntes como salvador, mas ele mesmo era o grande vilão da história. É um subtexto bastante interessante de se observar.
O desespero é o grande elemento de terror presente aqui.
Não atoa, esse é o grande final, no meio da picotagem da linha do tempo, Kotaro aparece em cima de um navio afundado gritando aos ventos "O QUE ESTÁ ACONTECENDO??" e então o mangá acaba. Em um desglorioso fim.
No fringir dos ovos
Kamen Rider Black não é uma história de ação de aventura com sangue para parecer mais madura, é algo genuinamente terrível, escabroso e com momentos de tensão máxima. Mesmo sem perder elementos essenciais para um Tokusatsu, daí vai ficar naquela se é um tokusatsu de terror ou um terror com elementos de tokusatsu, acredito que tenha valência para as duas interpretações.
A maioria das obras de terror trabalham com o medo, mas esse não é o único sentimento desgostoso no catalogo de emoções humanas, em Kamen Rider Black nada vai te assustar, mas o aflição de acompanhar os acontecimentos... Não é brinquedo não.
Não dá pra ignorar o comentário político presentes, um grupo que quer exterminar a vida humana na terra para império de uma raça superior é nazifascista, não precisa ser tão inteligente para retirar essa interpretação, que está presente desde do primeiro título em 71. Também umas conversas com temáticas relativas ao cyberpunk, uma desconfiança de uma elite corrupta, grandes coorporações e em menor grau os limites do que é a vida humana e daquilo que é uma máquina, ou até onde as máquinas são capazes de ter vida.
Pensa, um desaventurado que consegue vira um grilo gigante é hábil a ser chamado de humano? Díficil dizer, do mesmo valem para os outros monstros.
Mais do que altamente recomendado é um clássico, seja pelo seriado de televisão ou mangá, essa obra precisa estar na sua lista. Especialmente para quem é interessado na cultura japonesa.
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